No último post da série sobre a Guerrilha do Araguaia, os derradeiros momentos da guerrilha.
x-x-x
No dia 14 de maio de 1974, Dina não virou borboleta como se dizia possível entre os moradores do Bico do Papagaio (sudeste do Pará). A dois dias de completar 29 anos, Dinalva Oliveira Teixeira – geóloga que abandonara um emprego estável e uma vida confortável para se juntar à Guerrilha do Araguaia – estava escondida na mata, passando fome. Sabia que os soldados do Exército estavam por perto e sabia também que eles tinham ordens para matar todos os militantes do PCdoB, inclusive os detidos. Dina pressentia a chegada da morte. Mas ainda havia tempo para um ajuste de contas.
Papel e caneta na mão, Dina escreveu uma carta para Ângelo Arroyo, um dos líderes da guerrilha, que havia fugido para São Paulo deixando seus comandados à deriva. “Desertor”, foi como Dina o tratou.
Do sonho de derrubar a ditadura militar e implantar no Brasil uma ditadura comunista aos moldes de Cuba e da China, quase nada sobrara. Segundo o relato de Dina, do grupo inicial de 69 guerrilheiros, restavam apenas onze. As condições de sobrevivência eram precárias e a população local já não os apoiava. “Sentimos que a morte se aproxima”, escreveu, “de algum lugar no Araguaia”, a única mulher a alcançar um posto de comando na guerrilha.
No mês seguinte, Dina foi capturada. Com era esperado, o Exército a executou.
O relato de Dina é citado num documento do DOI/Codi de São Paulo obtido pelo blog. É o Relatório Especial de Informações nº 1/77, de 1977, de 46 páginas e carimbo de secreto. (Veja trechos do documento ao longo do blog e a íntegra, aqui. As páginas estão embaralhadas; a sequência correta para leitura é 1, 12, 23, 34, 42-46, 2-11, 13-22, 24, 33, 35-36).
O mesmo documento traz longos trechos do diário de Ângelo Arroyo. “Não sabemos qual a situação de guerra e quantos companheiros resistem atualmente (…). Pelas informações que temos, deduzimos que a guerra não foi liquidada”, escreveu ele no dia 6 de junho de 1975. Engano. A “guerra” no Araguaia havia acabado havia quase um ano. No diário, Arroyo faz um arremedo de autocrítica:
- “Cometeram-se alguns erros que nos levaram a sofrer uma derrota temporária”;
- “Muita concentração de companheiros numa área pequena do ponto de vista de terreno e massa. (…) Poderíamos ter dispersado mais os companheiros (…)”;
- “Não ter preparado área de refúgio fora da zona de guerra”;
- “Não preparamos uma rede de informação e comunicação”;
- “A política com relação aos elementos suspeitos e alguns bate-paus foi de complacência, não foi certo não termos liquidado alguns elementos inimigos e aos suspeitos deveríamos ter exigido que saíssem da área”;
- “O armamento era precário”;
- “Subestimamos o inimigo, o que levou à falta de vigilância”;
Arroyo acreditava – ou queria acreditar – que a luta não estava vencida. Dizia que era preciso “continuar mantendo acessa a luta no Araguaia, porém sem exagerar”. “O caminho da revolução não é retilíneo (…), estamos no começo, a China durou 25 anos, Vietnan 30, Camboja 5, Cuba 6, a nossa luta não sabemos o tempo que vai demorar, (…) temos de começar do nada, não temos fronteiras amigas”, escreveu ele.
Um ano e meio depois de deixar aquelas impressões no diário, Ângelo Arroyo foi morto em São Paulo, pelo DOI/Codi, no episódio que ficaria conhecido como Chacina da Lapa.
Cada coisa é publicada hoje em dia que faz pensar se esses dias realmente passaram. Se essa notícia que abaixo segue fosse verdade a situação estaria pior do que está. Em algumas técnicas a caserna ainda não perdeu a mão: desinformação e propaganda.
Abin fica submetida ao GSI
http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110313/not_imp691250,0.php