O repórter em cobertura de risco

Num fim de tarde do longínquo ano de 1995, quando cobria no Peru a reeleição do presidente Alberto Fujimori, a pauta do dia me levou a acompanhar uma manifestação de opositores, que protestavam contra as desavergonhadas fraudes ocorridas no pleito. Havia por volta de 500 pessoas, muito inflamadas. O clima era pesado.

Ao chegar à Praça Grau, em frente ao Palácio de Justiça, no centro de Lima, os manifestantes se depararam com uma barreira militar. Não se intimidaram. Munidos de pedras, avançaram. Avancei também, buscando, porém, ficar fora da linha do iminente combate.

Quanto tudo indicava que haveria o clássico embate homem a homem, um tanque de guerra surgiu e avançou sobre a praça, passando por cima de canteiros, indo em direção aos manifestantes. Num átimo, os opositores dispersaram, sendo seguidos pelos militares e pelo tanque. Bombas de gás lacrimogêneo espocavam em todos os lugares, fazendo a praça ficar dentro de uma nuvem.

Já não havia mais duas linhas, uma formada por manifestantes e outra por militares. Embolaram-se. A posição neutra onde eu me encontrara também desaparecera. Nenhum lugar era seguro.

Na confusão, vi colegas estrangeiros tirarem de dentro de suas mochilas coletes a prova de balas e máscaras anti-gás. Os equipamentos traziam em letras garrafais a palavra PRESS.

Eu não tinha nenhum daqueles equipamentos. Na verdade, nunca tinha passado pela minha cabeça que eu poderia precisar deles.

xxx

Em 2004, nove anos depois, em Porto Príncipe, cobrindo os esforços da Força de Paz da ONU para a estabilização do Haiti, tive a oportunidade de acompanhar uma patrulha militar que buscava prender criminosos escondidos na Cité Soleil, maior favela da capital. O comboio era formado por veículos blindados, ladeados por militares fortemente armados. A mim, assim como aos demais jornalistas, sobrou um caminhão aberto. Fomos. Antes, porém, recebemos coletes a prova de balas e os tradicionais capacetes azuis das Forças de Paz da ONU. Perguntei quais os tipos de munição o colete conseguia resistir. Ouvi, aliado, que ele segurava tiros de fuzil.

5 Comentários

Arquivado em Histórias de repórter, Mundo

5 Respostas para “O repórter em cobertura de risco

  1. Victor Schwaner

    Poxa, se estes coletes da ONU seguram tiros de fuzil, porque não temos desses aqui? O cinegrafista da Band morreu porque um tiro dessta arma atravessou o colete, não é? Ou estou enganado? Ou nem estes da ONU seguram?

  2. Não devia dar nem pra tomar um chope depois do expediente num lugar desses..

  3. Profissão repórter: mercado de trabalho reduzido, salários baixos, liberdade editorial restrita, sofre com processos de poderosos e corre risco de vida…

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